Saúde • 09:17h • 28 de agosto de 2025
Pesquisadores da USP criticam foco exagerado na proteína
Estudo mostra que o brasileiro já consome proteínas em níveis adequados, mas enfrenta carências em frutas, verduras e diversidade alimentar. Especialistas defendem atenção ao sistema agroalimentar e à educação nutricional, em vez da ênfase em suplementos
Jornalista: Carolina Javera MTb 37.921 com informações de Agência SP | Foto: Arquivo Âncora1

Presente no centro das discussões sobre saúde e alimentação, a proteína é considerada essencial tanto por organismos internacionais quanto por influenciadores fitness. Enquanto os primeiros a relacionam à pobreza e à insegurança alimentar, os segundos promovem seu consumo em dietas e suplementos, como o whey protein. Mas, afinal, será que a população precisa de tanta proteína quanto se imagina?
Pesquisadores da Faculdade de Saúde Pública da USP, em parceria com o Instituto de Estudos Avançados (IEA) e o Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde (Nupens), analisaram dados populacionais e concluíram que o consumo médio de proteína no Brasil já está acima das recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS). Enquanto o órgão sugere que o nutriente represente entre 10% e 15% da energia diária, a média brasileira chega a 18% — mesmo entre os mais pobres.
Segundo a pesquisadora Nadine Marques, quando a ingestão de calorias é suficiente, o consumo proteico também tende a ser adequado. Já Ricardo Abramovay, docente do IEA, ressalta que a falta de proteína em populações subnutridas decorre da fome, e não do baixo consumo específico do nutriente. “Se não há energia suficiente, a proteína é usada como combustível, e não para sua função essencial no organismo”, explica.
Os pesquisadores também destacam que a suplementação proteica só se justifica em casos específicos, como no de atletas de alto rendimento, para quem a recomendação máxima é de 2g por quilo de peso corporal. Para a população geral, reforçam que a prioridade deve ser a qualidade da dieta como um todo.
Entretanto, a realidade brasileira mostra um cenário desigual. Dados do Ministério da Saúde revelam que 79% dos adultos nas capitais não atingem a recomendação mínima de frutas, legumes e verduras. Além disso, a insegurança alimentar ainda afeta milhões: 253 municípios têm mais de 10% das crianças menores de 5 anos com desnutrição aguda.
O problema, afirmam os pesquisadores, não é a falta de produção de alimentos, mas a estrutura do sistema agroalimentar, marcado pelo predomínio da carne e pela concentração em monoculturas. Esse modelo, além de gerar impactos ambientais, contribui para a homogeneização das dietas e a expansão de alimentos ultraprocessados em áreas de baixa renda.
Para Abramovay, a solução não se limita à distribuição de alimentos ou transferência de renda: “É preciso transformar as instituições que determinam nossas escolhas alimentares”.
O estudo também resgata a crítica histórica ao chamado “fetiche da proteína”, presente desde meados do século XX, quando organismos internacionais passaram a defender a suplementação artificial em países pobres — muitas vezes atendendo a interesses econômicos de nações ricas. Hoje, o protagonismo do nutriente é reforçado por influenciadores digitais, que ampliam o consumo de suplementos sem base científica sólida.
“Mais importante que consumir muita carne é garantir diversidade no prato, com alimentos naturais e culturalmente relevantes”, afirma Nadine Marques. Para ela, a educação alimentar desde a infância é chave para formar adultos conscientes de suas escolhas.
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