Ciência e Tecnologia • 09:18h • 06 de setembro de 2025
Como o intestino da barata pode turbinar um etanol mais limpo
Pesquisadores da USP e da UFRJ mapearam como a barata Periplaneta americana degrada fibras vegetais com altíssima eficiência
Jornalista: Carolina Javera MTb 37.921 com informações de Agência SP | Foto: Governo de SP
Encontrar uma barata nunca parece boa companhia, mas, para a bioenergia, ela pode ser uma aliada e tanto. Estudo do Instituto de Biociências da USP, em parceria com a UFRJ, descreveu em detalhes como a Periplaneta americana (comum em áreas urbanas) consegue processar uma dieta variadíssima de matéria orgânica com enorme eficiência. O objetivo é biomimetizar esse sistema e aplicá-lo à indústria do etanol.
No laboratório da Botânica/USP, o grupo de Marcos Buckeridge investigou quais enzimas e estruturas do trato digestivo atacam a biomassa vegetal. Entender essa “usina biológica” abre caminho para coquetéis enzimáticos e processos mais brandos (menos químicos agressivos e temperaturas moderadas) na conversão do bagaço de cana em açúcares fermentáveis — etapa crítica para produzir etanol de segunda geração. Segundo Buckeridge, isso pode aumentar a eficiência, reduzir custos e, ao extrair mais energia por tonelada, diminuir a pressão por novas áreas agrícolas.
Ednildo Machado, entomólogo da UFRJ e coautor, reforça: não se trata de usar baratas na linha de produção, mas de replicar em escala industrial o que a natureza já resolveu. “Olhar para a natureza e copiar” é a lógica das soluções baseadas na natureza.
Os cientistas descrevem o trato digestivo da barata como uma linha de produção em quatro etapas, altamente integrada:
- Trituração mecânica — “dentes” de quitina moem as fibras;
- Câmara enzimática — enzimas iniciam a quebra da biomassa;
- Ambiente alcalino e oxirredutivo — pH alto favorece a degradação dos açúcares de interesse industrial;
- Microbiota especializada — bactérias residentes finalizam a digestão.
Replicar esse fluxo — do desenho dos coquetéis enzimáticos à engenharia de reatores que imitem movimentos peristálticos — pode acelerar a hidrólise da celulose e da hemicelulose, encurtando prazos e contas da indústria. “Se produzirmos mais etanol, mais barato, faremos mais com menos área e menor emissão de carbono”, diz Buckeridge.
Os próximos passos incluem ampliar a busca por enzimas e microrganismos em outros insetos “especialistas” em madeira e fibras. Cupins e tenébrios estão no radar; os cupins, em especial, chegam a degradar quase 90% da celulose, sugerindo novos coquetéis e arranjos de processo.
Em resumo: baratas não vão para a fábrica, mas seu manual digestivo pode inspirar uma nova geração de biotecnologias para um etanol mais limpo, eficiente e competitivo.
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